Edição 1.395 página 16 100 ANOS DE RÁDIO NO BRASIL Por Álvaro Bufarah (*) Do alto da sua experiência, Paulito conta grandes feitos em um mundo radiofônico baseado no ambiente analógico. Quando pergunto a ele sobre as vantagens da tecnologia e a redução da criatividade nas emissoras, levanta um problema latente: a falta de produção nas rádios. Paulo Machado de Carvalho Neto vivenciou a busca de uma nova identidade para o rádio com a chegada da TV, o impacto das transmissões em cores (1970) e o reposicionamento do meio como referência emmúsica, esportes e notícias. Diante disso, ele se recorda que havia uma grande diferença na contratação de novos quadros naquele período. Muitos dos jovens talentos não eram jornalista ou radialistas, mas advogados, escritores, professores. Ou seja, havia uma capacitação ampla, que garantia uma bagagemúnica para cada um dos profissionais. Desta forma, tivemos Blota Jr. e Casemiro Pinto Neto, ambos formados em Direito. Para Paulito, essa formação cultural garantia a pronúncia bem elaborada das frases, as perguntas certas em momentos cruciais para as entrevistas etc. “Com a evolução do rádio, isso de alguma forma se transferiu para a televisão”, recorda. “E naquela ocasião o rádio tinha uma coisa muito importante, que era a produção, ou seja, tinha produtor de rádio, pessoas que faziam, escreviam matérias para o rádio”. Enfim, com as transformações do meio houve a chegada dos comunicadores, que trouxeram suas equipes e basicamente não utilizavamos produtores para asmesmas funções. Os comunicadores eram mais personalistas e performáticos, trazendomais entretenimento que jornalismo. Paulito afirma que isso levou, gradativamente, à redução das produções e ao empobrecimento das programações, que ficaram dependentes dos comunicadores para manter suas audiências. “E o comunicador passou a se autoproduzir. Ou seja, ele ia para o microfone e fazia o trabalho dentro das suas características e com aquilo que sabia fazer”, afirma. Ele diz que a ironia é que atualmente a volta do consumo de áudio, principalmente pelos mais jovens, em formato de podcasts e streaming, é a consagração de volta do trabalho de pré-produção e produção. Para ele, o sucesso dos podcasts ocorre pelo tipo de conteúdo que apresentam, já que estão desobrigados a cumprir um tempo específico e podem ser acessados quantas vezes o ouvinte quiser e no momento que preferir. Outro ponto importante é que, para Paulito, podcast, rádio na web, streaming, “é tudo rádio”, pois se baseiamemconteúdos sonoros que exploram a sensibilidade auditiva dos ouvintes. Desta forma, não importa se o locutor é feio ou bonito; se a narrativa for boa, irá prender os ouvintes, que voltarão para ouvir mais, pois estamos atuando com as referências e a imaginação de cada um. “O rádio perdeu muito quando deixou de investir em produção” (Esta é a segunda parte da entrevista de Paulito Machado de Carvalho, o Paulito, da Jovem Pan. A primeira pode ser conferida aqui) “Eu acho que essa é a grande característica do rádio e que faz com que ele sobreviva eternamente. Então, o que vejo hoje? Vejo que, nesses aplicativos, todos nós estamos voltando a ter criatividade, coisa que durante um determinado período deixou de existir. Por quê? Por que não tinha produção. Eu entendo que a produção, seja ela jornalística, seja ela de entretenimento, é fundamental para a manutenção de uma boa programação”, sentencia. O uso da tecnologia para a melhoria dos conteúdos e da qualidade das transmissões é defendido pelo neto de Paulo Machado de Carvalho, mas ele ressalva que há uma grande preocupação com a distorção dos fatos para a construção de fake news: “É uma coisa que realmente chama muito a atenção. É evidente que que em momento algum pode se defender a censura ou o impedir que se faça alguma coisa. Eu entendo, porém, que precisamos de alguma forma ter alguns parâmetros. Por quê? Porque existemcoisas que realmente transcendemo real, chegamàs raias do absurdo. Não se pode admitir que determinadas coisas sejam feitas”. Nesse ponto da entrevista questiono sobre as ações da Jovem Pan, que foram bastante questionadas no período eleitoral, por seu posicionamento político. Sobre isso, Paulito afirma que não tem nenhuma interferência no comando da empresa e que, na sua estrita opinião, as mudanças na rádio foram feitas de forma um pouco acelerada demais: “O que eu entendo é o seguinte: a Jovem Pan se aproveitou, de alguma forma, de um momento extremamente importante da vida brasileira, em que houve uma tendência a um lado mais direitista. A Jovem Pan engajou-se nisso e acabou fazendo com que ela, de alguma forma, fosse porta-voz dessa direita. Não, não acho que tenha sido ruim. Pelo contrário, foi bom. Houve audiência, houve prestígio, a empresa cresceu. Aquele momento foi extremamente oportuno. Porém, o jogo mudou, e a partir do momento em que mudou, eu entendia e entendo que a JovemPan deveria preocupar-se em, de alguma forma, Paulito Machado de Carvalho
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