Edição 1.400 página 26 Nosso estoque do Memórias da Redação continua baixo. Se você temalguma história de redação interessantepara contar mande para [email protected]. n A colaboração desta semana é de Adhemar Altieri, diretor executivo e fundador daMediaLink Comunicação Corporativa, que foi diretor de Jornalismo da Rádio Eldorado de 1982 a 1987 e de 1997 a 2001. Teve também passagens por TV Globo e SBT. No exterior, foi editor-chefe de telejornais do canal mundial de telejornalismo Newsworld International, da rede pública canadense CBC, editor de internacional do programa de radiodocumentários SundayMorning, e editor de internacional da CTV, principal rede privada do país; correspondente no Canadá e no Brasil da CBS News, maior rede de jornalismo de rádio e TV dos Estados Unidos, e por 12 anos comentarista do BBC World Service. Adhemar Altieri O exemplo que veio de Recife O próximo dia 27 de abril marca o segundo aniversário da morte de Carlos Garcia, mais um entre as dezenas de milhares de perdas para a Covid-19. Falecido aos 87 anos, era um verdadeiro ícone do jornalismo nacional, pioneiro do que hoje é conhecido como “ jornalismo de dados” e histórico chefe da sucursal do Estadão em Recife. Garcia exigia precisão e qualidade nas matérias produzidas por sua equipe que, com frequência, eram destaque no Estadão de domingo, espaço desejado por qualquer jornalista que levasse a sério o que fazia. Por insistir em contar verdades sobre o que estava por trás da seca, fugindo dos estereótipos que caracterizavam a cobertura do Nordeste que chegava aos grandes veículos do Sul, foi interrogado incontáveis vezes, detido e torturado durante a ditadura militar. Garcia já era tudo isso quando o conheci em 1983, mas eu não sabia de nada sobre ele quando o encontrei na capital pernambucana. Fui lá pedir o engajamento dele e da equipe da sucursal no projeto jornalístico que estávamos implantando na Rádio Eldorado de São Paulo. Na época, o Estadão mantinha sucursais em várias das principais capitais do País, as maiores em Brasília e no Rio de Janeiro. Peça central do projeto na Eldorado era a integração, no ar, dos outros veículos do Grupo Estado – Estadão, Jornal da Tarde e Agência Estado. Garcia me recebeu com enorme cortesia, ele um veterano respeitado, eu com meus 26 anos e mal começando a construir a carreira. A ideia não era tão simples de emplacar com os adeptos das “pretinhas”. A visão que prevalecia com a grande maioria dos profissionais do Grupo era que jornalismo se escrevia e publicava em papel. Rádio passava muito longe do que eles percebiam como jornalismo. Fazer rádio, então, estava fora de qualquer expectativa. Só muito tempo depois da primeira conversa eu entendi a importância da contribuição do Garcia para esse projeto, que acabou gerando uma resposta positiva não só para a Eldorado, mas para o Grupo Estado inteiro. Ele não só me atendeu e prestou atenção no que eu queria, às vezes sorrindo e talvez imaginando “esse garoto deve estar sonhando”, mas gostou da iniciativa, engajou toda a sucursal de Recife e participou, ele próprio. Sim, ele telefonava para a Eldorado e gravava reportagens, sempre com a assinatura padrão no final: Carlos Garcia, Eldorado, Recife”. A adesão do Garcia, percebi com o tempo, chamou muita atenção dentro do Grupo Estado. O respeito que ele merecia de todos também funcionava para derrubar obstáculos, principalmente entre os que achavam que telefonar para a Eldorado seria um estorvo semmaiores consequências. Ou, que aquela ideia de colocar gente “de jornal” no rádio não iria a lugar algum. Com o apoio de João Lara Mesquita, então diretor da Eldorado, acabei indo a todas as sucursais e em todas, com o tempo, a ideia acabou sendo bem recebida e executada. O conjunto de conversas foi um aprendizado fantástico sobre jornalismo e a própria empresa: Carlos Chagas, Jorge Rosa e José Márcio Mendonça, em Brasília; Ayrton Baffa, Altair Baffa (o Baffinha) e Antonio Cunha, no Rio; o saudoso Dirceu Pio, em Curitiba: Warley Ornellas, em Belo Horizonte; Carlos Navarro. em Salvador; José Aparecido Miguel, na sucursal de Santos; Germano de Oliveira, no ABC, e seu irmão Francisco, na sucursal de Porto Alegre. Chegamos a ter mais de 100 colaboradores pelo Brasil, pois fomos além das sucursais e convidamos também correspondentes dos jornais e da Agência Estado em cidades onde não havia sucursal. Com o tempo, as redações em São Paulo também se interessaram e muitos, principalmente da Geral do Estado e do JT, aderiram. E eram todos colaboradores mesmo, pagos por matéria – cada matéria recebida era anotada e no final do mês, em tempos sem online e PIX, cada um recebia um “chequinho” da Eldorado. Eram tempos de inflação galopante, então a cada três meses era preciso ir à sede, na Marginal, pedir autorização para ajustar os valores pagos. O dinheiro virava pó e era preciso subir o valor por matéria ou o esquema todo correria o risco de entrar em colapso. Carlos Garcia
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