Jornalistas&Cia 1402

Edição 1.402 página 11 PRECIO SIDADES do Por Assis Ângelo Acervo ASSIS ÂNGELO A literatura de cordel é coisa boa, séria e engraçada. Na literatura de cordel tem de tudo: história geral, fatos corriqueiros e inventados; histórias de príncipes e princesas, fadas, bruxas, natureza, animais e de coisas de outros mundos. A classificação vai desde temas como religião, cangaço e gracejo. Trata também de figuras famosas como Padre Ciço, Lampião, Getulio, Lula e até Roberto Carlos. Na literatura de cordel não é difícil achar folhetos que tratam de temas do cotidiano e de personagens comuns que de uma hora pra outra caem na boca do povo. O adultério é tema comum e picante, desenvolvido por cordelistas desde o passado. O corno como personagem folclórico aparece em inúmeros folhetos. O ato de cornear é tão antigo e natural como o movimento das ondas do mar e o pôr do sol. Contraditória em muitos pontos e temas, a Igreja condena os pulos de cerca. Nas páginas do Velho Testamento é dito que a mulher deve obedecer e atender a todos os desejos do homem. Segundo a Igreja é pecado trair. A mulher traidora deve arder no fogo dos infernos. Ai, ai, quanto exagero! No dia 26 de março de 1986 estreou no Rio de Janeiro a comédia Trair e Coçar é só Começar, do ator Marcos Caruso. Tudo gira em torno de um casal fora de qualquer suspeita no tocante à infidelidade. Na história entra uma doméstica. Milhões de pessoas viram essa peça, que já é referência no Guinness. Engraçadíssima. Infidelidade conjugal é assunto que anda na boca de todo mundo. E também nas mídias. Nomes conhecidos da chamada cultura de massa às vezes nos surpreendem com histórias mirabolantes envolvendo personagens que fazem da traição um hábito. O compositor e cantor brega Falcão escreveu, para deleite de seus fãs, um folheto de cordel em que narra o encontro dele com um ET vindo sabe-se lá de onde! Queria conselhos de como se comportar após receber um belo par de chifres na testa: aceitar ou ir pro pau? Começa assim: Se você acha que gaia É coisa do imaginário Que tem o nosso planeta Como seu único cenário Veja então este relato Onde é narrado o fato De um chifre interplanetário... O tal ET conta que no seu planeta não tem bodega pra se beber boa pinga e tal. E corno é coisa rara, mas tem. Ele, por exemplo. Tanto que veio à Terra pra recorrer aos préstimos de Falcão. Chateado, o ET classificou a iniciativa da sua mulher como um “deslize”, só comparável ao que fez o personagem do poeta popular Zé Limeira: O velho Tomé de Sousa Governador da Bahia Casou e no mesmo dia Passou a pica na esposa Ele fez que nem raposa Comeu na frente e atrás Chegou na beira do cais Onde o navio trefega Comeu o padre Nobrega Os tempos não voltam mais! Licenciosidade na cultura popular − I Fausto Bergocce Depois de aconselhado, e bem aconselho por Falcão, o ET voltou todo satisfeito ao lugar de onde veio. Parecia tranquilo. Falcão: Enfim, o ET me disse Feliz e muito contente Que só tem a agradecer Pra sempre e eternamente Ter visto de um modo enfático De um jeito assim tão didático Que corno também é gente Na literatura popular se acham definições no mínimo engraçadas para o cidadão que é premiado com chifres pela mulher. Exemplo: O Corno Ateu: Aquele que leva chifre, mas não acredita; O Bravo: Aquele que quando é chamado de corno, quer brigar; O Bateria: O que vive dizendo,”Vou tomar uma solução”; O Cebola: Quando vê a mulher com outro, chora; O Vidente: Aquele que diz “Eu já sabia”; O Cigano: Aquele que toda vez que leva chifre, muda de bairro; O Famoso: Aquele que por onde passa, é reconhecido como tal; O Fofoqueiro: Aquele que leva chifre e sai contando para todo mundo; O Frio: O que leva chifre e não esquenta; O Iô-Iô: O que vai mas volta; O Matemático: O que vê a mulher fazendo 69 com outro e vai para o bar tomar uma 51, pois enfim ninguém é de ferro. A poesia publicada em cordel não foi inventada por brasileiros. Referências há desse tipo de poesia desde a Idade Média. Muitos autores clássicos tiveram e ainda têm partes da sua obra adaptadas para folhetos. Caso de Giovanni Boccaccio. Que viveu no século 14. É dele a obra-prima Decameron. Dessa obra são extraídos textos para a adaptação. Exemplos: Chifre com chifre se paga e O homem que foi ao inferno e voltou chifrudo. São muitas as piadas em volta do corno. Uma delas trata de um sujeito tentando pular de um prédio pra se matar. Lá embaixo a mulher diz: “Para, não pula! Eu pus cornos em você e não asas!”. A vida é uma comédia. VEJA: O TOMÉ DE SOUZA DE ZÉ LIMEIRA Foto por Flor Maria e ilustração de Fausto Bergocce Contatos pelos [email protected], http://assisangelo.blogspot.com, 11-3661-4561 e 11-98549-0333

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