Edição 1.425 página 14 Menos conteúdo, mais audiência Faz quatro anos que acompanho a estratégia do “menos é mais” na produção de conteúdo por empresas jornalísticas. São vários cases, estudos e aulas que surgiram em função de uma máxima usada noutras áreas, como na corrente da arquitetura que caminha de mãos dadas com o design minimalista. O pai da expressão foi um arquiteto alemão que experimentou o ápice da sua carreira no período entre-guerras, Ludwig van der Rohe. Não por acaso, ele foi diretor da escola germânica Bauhaus, onde nasceu o estilo homônimo, cujo princípio mais conhecido é “forma segue função". Não foi para menos. Reconstruir um país destruído pela guerra era uma tarefa complexa, sobretudo pela falta de matéria-prima e pela necessidade de erguer edifícios e redesenhar objetos para uso cotidiano. As ornamentações de prédios deram lugar a linhas retas. O que era belo precisava se tornar funcional. Cada material tinha de ser aproveitado inteligentemente; daí a prevalência de elementos versáteis, resistentes e baratos, como a madeira, o aço e o vidro. Mas o que isso tudo tem a ver com jornalismo? Digamos, talvez, que nossa indústria esteja atravessando um pós-guerra, clamando por reconstrução. No caso do jornalismo, entretanto, o excesso não se reflete apenas em infraestruturas e operações caras. Ao contrário, o exagero aparece na quantidade de conteúdo produzido, atrelado a um modelo de negócios onde “mais é sempre melhor": a publicidade. Desafiando a publicidade Há alguns dias, o título da newsletter do analista de mídia dinamarquês, Thomas Baekdal, perguntava: “Você quer cliques ou leitores?”. A questão é tão simples quanto cruel. É claro que qualquer um de nós deseja que seu trabalho seja efetivamente consumido (lido, assistido, ouvido) com atenção, do começo ao fim. Mas o que, de fato, perseguimos? Enquanto tentamos equilibrar os dois pratinhos ao mesmo tempo, perseguindo cliques E leitores, produzimos toneladas de conteúdo para aumentar a extensão da rede que jogamos ao mar. Ora, quanto maior a rede, mais peixes virão! Hub de produção de conhecimento e análise de tendências para comunicação e jornalismo Ana Brambilla “Você não clicou na matéria do carro-bomba na Colômbia? Então talvez se interesse pelas eleições na Argentina! Ou preferiria descobrir o que sua posição de dormir diz sobre sua personalidade? Já sei: você quer mesmo é saber que a atriz Aracy Balamanian morreu ouvindo música clássica! Porque você não perderia uma só notícia sobre a sucessão do Lira na Câmara, né?” O problema é que há cada vez mais pescadores jogando redes cada vez maiores e a chance de sobrar algum peixe para cair na sua é cada vez menor. As redes já se cruzam e se embolam e a desinformação traduz o desinteresse crescente pelo jornalismo. Um dito popular lembra que nem Jesus Cristo conseguiu agradar a todos; mas jornalista segue firme neste propósito, nem que seja a fórceps! Se não agrada de um jeito, tenta agradar de outro. Se uma notícia ou um programa teve pouca audiência, produz outro, publica outra, faz mais! Uma hora, acerta. Afinal, o que conta é o número de audiência. A publicidade não é um modelo de negócios problemático. Ela tem sua lógica e funciona bem há décadas. Só que ela se orienta pelo volume. E volume de audiência era algo que tínhamos quando a informação era um bem escasso. Por isso a indústria da informação se ergueu e se consolidou: produzíamos um bem escasso. Já na indústria jornalística contemporânea, entretanto, a dinâmica é diferente. Assim, para quem deseja viver de publicidade - ou mesmo de assinaturas -, não basta ser bom, é preciso ser único. O volume de audiência é consequência No fim das contas, o problema não está na publicidade. É sobre ser relevante e fazer sentido a ponto de atrair a atenção de muitas pessoas. A publicidade é consequência disso e ela pode ser viável à medida em que o veículo alcance volume. De qual forma estamos buscando volume? Com mais conteúdo, mesmo que seja commodity, mesmo que haja 489 conteúdos iguais àquele em outros veículos, com quem nadamos em um oceano vermelho. Para a publicidade funcionar, para atrair um bom número de audiência, o princípio da escassez nunca fez tanto sentido. Quanto menos há, mais valioso é um produto. Se a oferta de todo tipo de informação é infinita, que demanda atendemos? Ou ainda: o que leva alguém a procurar, especificamente, por nós e não por outros? O que fazemos de diferente, de único, de escasso a ponto de atrair a atenção de muita gente? Procurar por um diferencial real é só um dos pontos que precisam ser pensados em uma estratégia editorial. É na exclusividade, na singularidade de um produto que mora a verdadeira inovação. Em tempos de informação excessiva, a inovação pode estar em publicar menos. Se os recursos são escassos, não tenhamos medo de ser simples, funcionais, úteis. Isso não tira nosso brilho; ao contrário, nos faz diferentes da multidão. Publicar menos é valorizar cada minuto de atenção da nossa audiência. Experimente! Branded content orbismedia.org Professora do Master: Negócios de Mídia e articulista do Orbis Media Review
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