Edição 1.441 página 12 Por Assis Ângelo PRECIO SIDADES do Acervo ASSIS ÂNGELO Contatos pelos [email protected], http://assisangelo.blogspot.com, 11-3661-4561 e 11-98549-0333 De 1970 para cá o “comércio” das chamadas “mulheres de vida fácil” cresceu assustadoramente, e os seus “pontos”, obviamente, duplicaram. Hoje, é comum deparar-se com grupos de garotas, algumas não tão novas, maquiadas ou não, bem vestidas ou não, “convidando” transeuntes apressados para rápidos instantes de “amor”, a qualquer hora do dia ou da noite. Diz Eduardo Galeano, autor de As Veias Abertas da América Latina: “É bem sabido que a prostituição é um subproduto da virtude; esta sociedade que compra tudo e tudo vende, hipocritamente condena os serviços daqueles que são usados para manter intactos os tabus e manter no alto os códigos de moral dessa mesma sociedade. Fabricam-se prostitutas como se fabricam roupas; tudo são bens de consumo: joga-se fora a roupa usada. Essas mulheres analfabetas cujas vidas são envenenadas pela humilhação e a miséria ignoram a rebelião que iria reivindicá-las como seres humanos, numa sociedade diferente, sem tarifas para o amor; mas em troca, encarnam-se a si mesmas, numa espécie de exorcismo ao inverso, e projetam para o plano religioso. Encarnam a mesma imagem que o sistema forjou delas, para usá-las e depreciá-las; mas aí, atenção: esse autorretrato é impresso em negativo, porque o objeto de desprezo passa a ser o objeto de adoração; a abominação abre caminhos para a devoção, e a prostituta decide que é sagrada. Achavam que eu fosse uma cadela? Pois eu sou uma deusa”. Depoimento de Baiana: “Eu e mais uma centena de mulheres iguais a mim fomos detidas pela Polícia. Os tiras nos levaram para o 2º DP (Bom Retiro). Lá fomos espancadas e tratadas que nem cachorros. É sempre assim. Exigiram ainda de cada uma de nós a quantia de Cr$ 1 mil. E ameaçaram: ou dão esse dinheiro ou assinam o 59 (Art.59, vadiagem. Código Penal). Como não aguento mais ser explorada, eu disse vou contar tudo isso ao juiz corregedor. Ai, então, eu ouvi: se for, a sua vida não valerá um vintém”. Foi numa noite de outubro deste ano. Os policiais da Seccional Centro efetuaram uma Operação Arrastão e levaram cerca de 100 prostitutas ao 2º Distrito para “averiguação”, segundo eles. Parte dessas mulheres foi liberada na manhã do dia seguinte. “Eu até tenho um salvo-conduto”, afirma Elvira Lopes. “Eu e outras colegas minhas. Licenciosidade na cultura popular (XL) (continuação de J&Cia 1.437, 1.438, 1.439 e 1.440) Mas os tiras não quiseram conversar. Eles disseram que usavam os salvo-condutos como papel higiênico, porque ‘o que nos interessa é dinheiro’. Não dei o que eles queriam e me bateram. Fui junto com outras mulheres ao Fórum, e contei tudo ao dr. Laércio Talli. Agora, morro de medo de sair às ruas, porque juraram me pegar”. Paris, 6/8/1973, AP: “Marthe Richard, a ex-vereadora de Paris que, em 1946, pregou a extinção dos bordéis na França, disse ontem que mudou de opinião e que agora acredita que a verdadeira libertação da mulher deve incluir, até mesmo, o direito de ganhar a vida como prostituta. A prostituição não é ilegal na França, mas a exploração de bordéis é punida com severas penas de prisão, por uma lei que tem, exatamente, o nome de Marthe Richard, atualmente com 84 anos. Numa entrevista a uma emissora de rádio, a sra. Richard disse que os bordéis deveriam ser reabertos e autorizados a funcionar livremente, como na Alemanha Ocidental. A lei que tem meu nome é obsoleta, disse ela, acrescentando: durante toda a minha vida lutei não contra a prostituição, mas sim pela libertação da mulher. E, em 1973, a liberdade da mulher exige que ela seja autorizada a fazer de seu corpo o que bem entender.” “Até aí, tudo bem”, disse-me um delegado, no Deic. “Lógico”, emendou outro, “a gente também vive num país livre”. DELEGADO UM − Agora, o que não pode acontecer é você, junto com a sua senhora ou irmã, ou amiga, ou namorada, sair à rua e se defrontar com os escândalos que essas mulheres aprontam. DELEGADO DOIS − Um cidadão de bem não pode passar pela avenida São João, por exemplo, sem receber uma pilhéria, uma “cantada”. Meu Deus do céu, em que tempos estamos! DELEGADO UM − Então, é por isso que a Polícia se vê obrigada a efetuar a recolha de prostitutas. DELEGADO DOIS − E de travestis. Os travestis são mais escandalosos que as prostitutas. DELEGADO UM − E perigosos. Acho que o confinamento seria uma forma, uma solução para o problema da prostituição em São Paulo. A própria Polícia seria beneficiada com isso, uma vez que o trabalho de vigilância, de investigação, se concentra numa determinada área. Confinamento. Procuramos o secretário Enio Viegas, da Segurança Pública, para falar sobre o assunto. Ele, no entanto, desculpou-se dizendo que estava muito ocupado e que entrássemos em contato com o delegado-geral de Polícia, Tácito Pinheiro Machado (1926-2005). (continua na próxima edição) Foto e reproduções de Flor Maria e Anna da Hora Marthe Richard em 1915 Wikimedia Commons
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