Jornalistas&Cia 1448

Edição 1.449 página 13 Por Assis Ângelo PRECIO SIDADES do Acervo ASSIS ÂNGELO Há prostitutas famosas que deixaram marcas indeléveis na memória de muita gente. Em 2016 foi descoberto um poema inédito do mineiro Murilo Mendes (1901-1975). Título: A Morte da Puta, que começa assim: “A puta morreu Dois soldados e quatro velas Ficaram de plantão a noite inteira...” Outro mineiro igualmente conhecido, Carlos Drummond de Andrade (19021987), escreveu e publicou o bonito poema A Puta. Lá pras tantas, ele escreve: “...Ela arreganha dentes largos De longe. Na mata do cabelo Se abre toda, chupante...” O poeta pernambucano Manuel Bandeira (1886-1968) publicou, já no seu primeiro livro, o belo Vou-me embora pra Pasárgada, que ele mesmo chegou a gravar num disco de vinil. Um trecho: “...É outra civilização Tem um processo seguro De impedir a concepção Tem telefone automático Tem alcaloide à vontade Tem prostitutas bonitas Para a gente namorar...” O insuspeito modernista Oswald de Andrade (1890-1954) pegou da pena e pôs no papel um poema a que intrigantemente intitulou de Flores Horizontais. Esse texto foi musicado por José Wisnik e gravado em 2000 pela cantora Elza Soares (1930-2022). Ei-lo: “Flores Horizontais Flores da vida Flores brancas de papel Da vida rubra de bordel Flores da vida Afogadas nas janelas do luar Carbonizadas de remédios, tapas, pontapés Escuras flores puras, putas, suicidas Sentimentais Flores horizontais Que rezais? Com Deus me deito Com Deus me levanto” A história de Elza é uma história fantástica, triste e violenta principalmente nos primeiros anos de sua vida. Era criança quando foi estuprada. Isso a marcou profundamente. O poema de Oswald musicado por Wisnik foi, para Elza, um presente, uma alegria e prazer imensos. Essa pérola lembrou-lhe os tempos em que a mãe e ela eram lavadeiras de roupa nas casas de granfinos. Licenciosidade na cultura popular (XLVIII) (continuação das edições 1.445, 1.446, 1.447 e 1.448) Carlos Drummond de Andrade Um dia Elza lembrou que numa das casas onde ela e a mãe trabalhavam ouviu da patroa um xingamento direcionado à própria filha, Ieda. Disse a mãe: “Você é uma puta!”. A tal garota não se conteve e retorquiu: “Sim, sou prostituta, mas sou rica, bonita e poderosa”. Elza ouviu isso e a partir daí passou a pensar sobre o assunto. “Puta é uma palavra bonita, não é?”, manifestou-se anos depois Elza. A prostituição, sabemos, está na boca do mundo. A música popular de todo canto registra o tema nas mais diversas línguas, pois. Odair José, cantor e compositor de sucesso nos anos 1970 e 80, deixou a sua marca em muitas canções classificadas pela crítica como “bregas”. Entre essas, Pare de Tomar a Pílula e Eu Vou Tirar Você Desse Lugar. Um trecho: Olha A primeira vez que eu estive aqui Foi só pra me distrair Eu vim em busca do amor Olha Foi então que eu lhe conheci Naquela noite fria, em seus braços Meus problemas esqueci Olha A segunda vez que eu estive aqui Já não foi pra distrair Eu senti saudade de você Olha Eu precisei do seu carinho Pois eu me sentia tão sozinho Já não podia mais lhe esquecer Eu vou tirar você desse lugar Eu vou levar você pra ficar comigo E não me interessa O que os outros vão pensar… Quando Odair José fazia sucesso, Marília Mendonça não havia nascido. Morreu com 30 anos de idade, em 2022. Deixou duas ou três centenas de músicas autorais. Uma dessas tem por título Troca de Calçada. Um pedaço: Se alguém passar por ela Fique em silêncio, não aponte o dedo Não julgue tão cedo Ela tem motivos pra estar desse jeito Isso é preconceito Viveu tanto desprezo Que até Deus duvida e chora lá de cima Era só uma menina Que dedicou a vida a amores de quinta

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