Jornalistas&Cia 1469

Edição 1.469 página 28 A entrevista no mosteiro de São Bento demorou mais do que o previsto. Atrasado para o almoço com uma de minhas filhas, cheguei apressado ao estacionamento aberto no Anhangabaú, perguntei se a chave estava no carro, entrei apressado e me mandei para Santo Amaro. Já na 23 de Maio tentei ligar o rádio... e o rádio não estava no painel. O estranho, pensei, é que atencioso, o ladrão tinha colocado uma tampa adequada no local onde faltava o rádio. Comecei a estranhar, olhei no banco de trás e em vez dos livros que deixara no carro havia várias plantas de engenharia, enroladas. Não havia dúvida, o carro não era meu. Na pressa, tinha entrado no primeiro Corolla branco e me mandara. Acabava de roubar um carro. Atrasado como estava para o almoço marcado e já quase no Ibirapuera, resolvi que era melhor ir para o compromisso e mais tarde destrocaria o veículo. Dito e feito. Cheguei às 14 h no estacionamento, o manobrista contou que percebeu na hora que eu tinha entrado no carro errado, mas quando foi avisar eu já estava saindo e não percebi seus sinais. Quando o dono do carro roubado apareceu, ele explicou o que tinha acontecido, disse que me conhecia, que eu era “boa gente” e a solução era ele deixar o telefone e ir embora com o meu veículo. À tarde, já no jornal, liguei para o tal dr. Eduardo, da Método Engenharia, e expliquei: − Quem fala é Luiz Roberto. Sou o ladrão do seu carro. − Muito prazer. Me diga, o senhor é ladrão há muito tempo? Percebendo que minha vítima estava levando a confusão numa boa, expliquei: − Não, na verdade o seu foi o primeiro carro que roubei. Mas foi tão fácil que estou pensando em mudar de profissão. Parece que ser ladrão é mais rentável que o jornalismo. Esclarecida a situação, ele me deu o endereço do escritório, em Moema, combinamos a destroca dos automóveis. n A história desta semana é novamente de Luiz Roberto de Souza Queiroz, o Bebeto ([email protected]), assíduo colaborador deste espaço, que esteve por muitos anos no Estadão e hoje atua em sua própria empresa de comunicação. Luiz Roberto Souza Queiroz Minha experiência como ladrão de automóvel Cheguei no fim da tarde no escritório da Método, fui recebido por uma secretária bem pentelha, nariz empinado, que perguntou se eu tinha marcado hora, porque “o dr. Eduardo não recebe ninguém fora da agenda”. − Tenho certeza que a mim vai receber. Por favor, avise que o ladrão está aqui na portaria. − O senhor está brincando? Empostei a voz de locutor da Eldorado, olhei bem sério para a garota metida e tasquei: “Escute, senhora, tenho o dobro da sua idade e basta olhar para a minha cara para ver que não estou para brincadeira. INFORME SEU PATRÃO QUE O LADRÃO ESTÁ AQUI!”. Com um olhar de ‘O senhor vai ver.....’ ela pegou o telefone e disse: “Dr. Eduardo, tem um homem aqui dizendo, desculpe, mas ele diz que é um ladrão e quer falar com o senhor. O que eu faço?” É claro que a resposta foi sucinta, “manda o ladrão subir”, e montando a maior cara de paisagem a recepcionista me indicou o caminho. Já na sala do tal dr. Eduardo, após um aperto de mão, ele explicou que não queria destrocar, gostaria de ficar com o meu carro. − O problema é que o meu carro tem 50 mil quilômetros, está bem rodado, tem até uma batidinha no para-choque e o seu está novinho, brilhando, prefiro ficar com ele. Deixei claro que ele iria se arrepender, realmente meu carro tinha 5 mil km, mas com a agravante de não estar pago. Ele teria que arcar com cinco prestações que restavam e não eram baratas. Diante do exposto o engenheiro concordou em destrocarmos as chaves, explicou onde tinha estacionado, eu contei que o carro dele estava parado na rua, mas bem em frente do escritório e nos despedimos, numa boa. Quando desci, a recepcionista estava que não se aguentava de curiosidade. Tentou puxar conversa, saber se eu já ia embora, se bem me lembro até me ofereceu um cafezinho que, é claro, recusei. Com meu próprio nariz bem mais empinado que o dela, desejei bom dia numa voz gelada e me mandei, deixando a coitada com todas as pulgas atrás da orelha. Espero que continuem lá. https://br.freepik.com/vetores/carro-sendo-roubado

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