Jornalistas&Cia 1507

Edição 1.507 - pág. 48 ANOS Muito se fala hoje sobre a maneira como os criminosos utilizam os meios da tecnologia para aplicar golpes em pessoas, empresas, bancos, através de seus computadores e sem sair de casa. Com o teclado de um notebook ou de um computador os hábeis estelionatários fazem um estrago tremendo na vida das pessoas e das empresas. A história que vou contar hoje é sobre um outro tipo de criminoso, que age sem arma, só com uma caneta, papel às vezes, muita conversa e um celular ou computador. Eles eram hábeis. Observadores. Muito observadores. Um olhar fixo num documento permitia todo tipo de falsificação. Desafiavam a polícia. A cada dia os golpes aumentavam. Os bancos eram as vítimas preferidas. Mas também tinham outros focos, como falsificar documentos para obter empréstimos, sacar dinheiro de contas correntes, de preferência dos clientes do Banco do Brasil. Dois deles fizeram parte da literatura policial dos anos 1960, 70, 80 e 90. A carreira acabou com a chegada da informática. Os velhos falsários deixaram o campo para a nova modalidade de crime usando o computador. Walmir Vieira de Azevedo, que desafiava os mais habilidosos policiais paulistas, e José Donato de Araújo, que com sua conversa e documentos falsos vendeu terrenos inexistentes, inclusive o Parque do Ibirapuera, e com depósitos bancários falsos comprou um navio. Os dois se tornaram personagens das histórias da Polícia Civil de São Paulo. Eles ficavam pouco tempo na cadeia apesar das longas penas. Saiam e os golpes voltavam a ser aplicados. Donato montara um longo dossiê falso e se dizia dono do Parque do Ibirapuera. Sua primeira vítima foi um vendedor de frutas do parque. Apresentou-se como doutor José Donato de Araújo e alegou que o terreno onde estava a banca de frutas era dele. Ou saia ou pagava aluguel. Ao ver os documentos, o fruteiro assinou um contrato de locação Renato Lombardi Edu Moraes/Record n A história desta semana é novamente de Renato Lombardi ([email protected]), comentarista de segurança e justiça da Rede Record. A malandragem romântica com o falsário para pagar na época Cr$ 200,00 por mês. Foram dois anos até Donato ser descoberto e denunciado. O golpe mais famoso de Donato foi ser “dono” do Parque do Ibirapuera. Em quatro pastas juntara centenas de documentos e uma procuração falsa de uma paulistana de família tradicional que o indicavam como dono de 70 mil m2 da área que abrangia as avenidas República do Líbano, Quarto Centenário, Rubem Berta e Ibirapuera, incluindo imóveis particulares e até o então QG do II Exército, hoje Comando do Sudeste. Várias pessoas compraram parte do Parque − que era um grande matagal − acreditando num boom imobiliário prometido pelo falsário. Com uma parte do Ibirapuera, Donato adquiriu do armador Uraquitá Bezerra Leite o navio São Pedro. O armador, ao descobrir o golpe, tentou recuperar o navio mas Donato já o vendera como sucata. Essas são algumas histórias de uma criminalidade diferente da que temos hoje. Suas armas e munição eram a conversa, canetas e papéis falsos. Walmir chegou a tentar um golpe simultâneo no Banco do Brasil com falsas ordens de pagamento, mas foi descoberto pelo gerente de uma agência da cidade de Vacaria, no Rio Grande do Sul. Uma das ações de Walmir foi falsificar a assinatura de um juiz numa audiência em Curitiba, e preparar na cadeia seu próprio alvará de soltura. A habilidade era tanta que até o juiz, quando viu a assinatura, ficou em dúvida se fora mesmo o falsário quem assinara. Walmir contou ao delegado João Violim Belão, que conseguiu prendê-lo depois de dois meses de investigação e observação. O estelionatário e falsário contou que, através de seus advogados provocou sua transferência de São Paulo, onde estava preso, para Curitiba, onde respondia a inúmeros processos. Seu plano era mesmo o de falsificar o alvará, pois na audiência com o juiz ficou olhando a maneira como ele assinava. Um de seus advogados conseguiu um documento com a assinatura. Quando da descoberta do falso documento Walmir estava longe da cadeia. Nunca mais se soube dele. Se vivo, estará com aproximadamente 100 anos. Sobre Donato também não consegui saber dele. Pesquisei e não encontrei nada dos dias atuais. A última vez que estiveram presos nos anos 1990 tinham mais de 80 anos.

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