#diversifica

No 1 – Pág. 28 adversidades. Estes estereótipos acabam reforçando a ideia de que tudo bem deixar a gente sofrer, porque aguentamos. E, a propósito, “arretado” é um termo que quase ninguém usa por lá. A gente só vê mesmo em novelas e na Regina Casé. Infelizmente, nesse sentido, o jornalismo ainda é um grande perpetuador de estereótipos”. Além de retratar com mais fidelidade as características e particularidades de uma população e sua região, ao eliminarmos estereótipos também nos permitimos olhar com mais atenção para enxergar novas qualidades e possibilidades. Se por um lado o Nordeste, e seus nove estados, são berço de “pessoas fortes, batalhadoras e que aguentam todas as adversidades”, como lembrou Nayara, por outro, também é uma região de oportunidades, pessoas criativas e muita inovação. “Infelizmente, a mídia ainda não está acostumada a olhar com bons olhos para fontes que vêm do Nordeste”, lembra. “Um pesquisador da UFBA, por exemplo, para ser considerado em uma reportagem de um veículo nacional, precisa ter especialização, mestrado, doutorado, indicação... Agora, se for um pesquisados da USP, ele só precisa ser pesquisador da USP”. Casos como este mostram que a diversidade não deve se limitar apenas a contratar profissionais e retratar a realidade de pessoas diversas, mas também considerar que elas podem e devem ser fontes de consulta nos temas em que são especialistas, e não apenas em reportagens sobre assuntos que afligem suas vidas. “Infelizmente, ainda há um questionamento preconceituoso, como se esses profissionais não pudessem ser especialistas em algo só porque são do Nordeste”, complementa. Sotaque neutro? É estarrecedor como ainda percebemos que algumas mudanças parecem ser necessárias, especialmente em frente às câmeras, para que cada profissional com um perfil considerado diverso seja aceito com mais naturalidade no ambiente de trabalho. Se você é LGBTQIA+, precisa adequar o jeito que fala ou até como se veste e se apresenta; se você é uma pessoa com deficiência, precisa parecer o máximo possível com uma pessoa sem deficiência; se é negro, seu cabelo precisa ser o mais discreto possível. Essa limitação, ou código de conduta velado, também existe para profissionais de outras regiões e envolve essencialmente seus sotaques. Até aí, o estereótipo do “sotaque nordestino” está presente. “Tem gente que acha que está fazendo um elogio quando diz que acha lindo o nosso ‘sotaque nordestino’. Primeiro, porque não existe um sotaque nordestino. Só no Ceará, das regiões que conheço, que são a capital, Fortaleza, e a região de onde sou, no Cariri, já são dois sotaques totalmente diferentes. Como também são diferentes de Teresina. O meu sotaque, por exemplo, já não é de lugar nenhum, porque mistura do Cariri, de onde sou, do Pernambuco, de onde meus pais são, com o de Teresina”, explica Nayara. Estagiária deste Jornalistas&Cia, Anna França mora em Juazeiro, na Bahia. A cidade, à beira do Rio São Francisco, fica a uma ponte de distância da pernambucana Petrolina. Segundo ela, mesmo com essa proximidade, a diferença de sotaques e cultura das duas populações é facilmente perceptível. “É triste ver nas aulas de telejornalismo alguns alunos fazendo um esforço tremendo para mudar o jeito de falar”, ressalta Anna. “Com isso, nossa identidade vai se perdendo, sendo roubada. E isso é muito cruel, porque quando aparece alguém em rede nacional com o nosso sotaque, ou pelo menos parecido com ele, sentimos uma certa afinidade. Mesmo que seja uma coisa mínima, é algo muito impactante, porque se aquela pessoa está ali, falando do seu jeito natural, sem nenhuma tentativa de ter sua identidade mudada, então sente que algum dia também vai conseguir chegar no mesmo lugar”. “Sabe aquela coisa de estudante de jornalismo que tem o sonho de trabalhar na Globo, porque é a maior, é uma referência?”, questiona Nayara. “Eu não sei como está isso hoje, mas até há pouco tempo esse pessoal tinha que fazer trabalho com fonoaudiólogo para se encaixar Anna França

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